Minha mãe era poeta. Meu avô membro da Academia Paulista de Letras. Quando eu nasci, meu pai escreveu um soneto para mim. Uma história que teima em fazer das palavras o lugar pleno de ser. Árvore de raízes profundas, cheia de frutos, e que, naturalmente, faz sombra.
Entre teus galhos, vaza luz forte, um brilho que cega. Tenho me provocado a ocupar um lugar na parte do que ilumina, e que por ser imensidão cabe todo tamanho de estrelas, todas as constelações. Só não cabe julgamento.
Cabe honra, cabe legado, cabe ser cria daquilo que se é. Cabe reconhecer-se, identificar-se, ter lugar. É nas entrelinhas desse caber, sem cabimento, que meu pensamento movimenta todas as palavras do peito. E caminha, corre, e outras tantas vezes se arrasta. E tropeça em reticências e pisa no pé dos pontos finais.
Escrever é estar viva. É dar olhos ao que é contemplação, dar corpo ao que é dança, entrega e suor. A letra, também como um corpo, é o próprio pertencimento da escrita. Palavra por palavra, rascunhada do coração – lápis da alma –, desenhando emoções e rabiscando incertezas. A cada linha, um entender melhor o mundo, a mim, o outro. O sonho de ser poesia e encantamento, e encontrar no verso o avesso e ainda a essência, a semente boa de uma infinita floresta em prosa.
13 de maio de 2020.